Coffee and Work

Por Gislene Feiten Haubrich

Empreendedorismo: como bem disse a Eliane em seu post divulgado no blog, eis um tema que é pauta em muitos ambientes diferentes. Tendo em vista a discussão que rolou lá no grupo d’Às de Paus no Telegram (se você ainda não acompanha a gente lá, clica aqui e vem), hoje o tema do blog volta a ser o empreender.

Fonte: Pixabay

A primeira questão que temos de ter em mente quando falamos em empreendedorismo é: não há um conceito definitivo, mas linhas de pensamento e interesse. Vamos apresentar alguns pontos de vista e depois avançamos para alguns apontamentos:

No escopo internacional, a Harvard Business Review apresenta a definição proposta pelo professor Professor Howard Stevenson, reconhecido como o padrinho dos estudos sobre empreendedorismo na Harvard Business School:  “empreendedorismo é a busca de oportunidades para além dos recursos controlados” (entrepreneurship is the pursuit of opportunity beyond resources controlled.).

Em seu artigo artigo na revista Forbes, Brett Nelson afirma que “a verdadeira essência do empreendedorismo é: definir, investir, construir e repetir” (This is the true essence of entrepreneurship: Define, invest, build, repeat).

No escopo nacional, trazemos a perspectiva do Sebrae: “empreendedorismo é a capacidade que uma pessoa tem de identificar problemas e oportunidades, desenvolver soluções e investir recursos na criação de algo positivo para a sociedade. Pode ser um negócio, um projeto ou mesmo um movimento que gere mudanças reais e impacto no cotidiano das pessoas”.

Já o portal Endeavor define empreendedorismo com base na atividade do/a empreendedor/a: “Empreendedores questionam a realidade e fazem acontecer a evolução todos os dias, em todas as partes do Brasil e do mundo. Ao inovar e solucionar problemas de outras pessoas, de outras empresas ou de toda a sociedade, um empreendedor e seu novo negócio promovem um grande desenvolvimento”.

Com base nessas quatro ideias, podemos depreender:

– é difícil definir empreendedorismo sem acionar o agente empreendedor;

– representa uma oportunidade, ou seja, demanda um olhar interessado à realidade, no sentido de propor soluções a problemas cotidianos;

–  visa mudar a percepção dos indivíduos em relação ao contexto onde estão inseridos.

Em síntese: empreender é uma escolha profissional que associa questões burocráticas, criativas e socialmente relevantes. Nesse sentido, para além de criar um negócio, empreender significa identificar uma necessidade do outro para, então, prover uma solução.

Por certo, você deve estar se perguntando: mas esse entendimento é distante da realidade, afinal de contas existem empreendedores por necessidade. Quer dizer, pessoas que perderam seus empregos e passaram a exercer uma atividade profissional por conta própria, o que se convencionou chamar como empreendedorismo. Então, você não está errado em seu questionamento.

Sempre que uma palavra entra no vocabulário cotidiano e vai se distanciando de sua origem de significado, ela se transforma. Empreendedorismo é uma dessas palavras. Em seu uso primário, referia-se a essa perspectiva ideologicamente ligada à transformação social mediante uma outra relação laboral. A adesão dos indivíduos foi fundamental para popularizar o termo e o uso inadequado e esvaziado pela repetição o responsável pela confusão atual. Quando grandes grupos de comunicação, empresas e outras instituições identificam a oportunidade de estimular sentidos relacionados ao status social mais sofisticado no tratamento do empreendedorismo, o sentido se transformou e beira a vulgarização, infelizmente.

Entretanto, o incentivo ao desenvolvimento das características empreendedoras é uma dimensão real de transformação social, o que representa um desafio àqueles que pesquisam e difundem o empreendedorismo. Pensando nisso, o professor Paulo Lemos da Unicamp, desenvolveu um curso – gratuito – disponível na plataforma Coursera. “O empreendedorismo e as competências do empreendedor” apresenta uma série de esclarecimentos e dicas para desenvolver comportamentos fundamentais, como competências pessoais, técnicas, contextuais e gerenciais.  

Fonte: Coursera - Curso O empreendedorismo e as competências do empreendedor

Por fim, na impossibilidade de fugir da polêmica “motorista do aplicativo é empreendedor/a”, fica claro que, por natureza, prestar o serviço de motorista não representa, de fato, um exercício do empreendedorismo. Entretanto, pode haver motoristas com uma visão apurada da realidade que o cerca, encontrando, assim, alternativas criativas a algum problema social que seus passageiros enfrentam. Nesse sentido, as características empreendedoras aprendidas e desenvolvidas por esse/a profissional, o que o aproxima da vivência e dos desafios empreendedores. O mesmo raciocínio se aplica a vendedores/as e outros profissionais liberais. Empreender vai muito além de uma definição legal (por exemplo, o MEI – microempreendedor individual), da prestação de um serviço ou ainda da constituição de uma empresa. Empreender implica um olhar crítico e aguçado das relações do cotidiano, capaz de reconhecer as necessidades do outro e propor uma solução capaz de transformar aquela realidade.

Empreender não implica apenas montar uma startup, escalonar, morar no Vale do Silício e outras vulgarizações do termo mediante a abordagem de esvaziada de pessoas interessadas em explorar outras pessoas. Empreender, como já dito, implica um olhar aguçado e crítico por parte do indivíduo, o que implica, justamente, questionar esses discursos simplificadores. Um dos exemplos mais incríveis sobre empreendedorismo e inovação, no meu ponto de vista, vem da Fundação Bill e Melinda Gates. Por meio de financiamento, diversas análises e propostas foram realizadas até que a mais viável pudesse ser apresentada por Gates em um evento na China (em 2018), cujo propósito era captar mais recursos para popularizar a invenção. É algo grande? Apenas muito dinheiro torna esse empreendimento possível? Talvez, mas o ponto que quero chamar atenção aqui é: Bill e Melinda Gates, com seus times, poderiam ter dedicado sua atenção à resolução de qualquer problema, mas eles optaram, por sua possibilidade financeira, é claro, por investir em soluções em contextos opostos aos seus. Essa, na minha perspectiva, é a essência do empreendedorismo: olhar para o contexto que não é apenas o seu, mas olhar para o outro, às necessidades que ele tem para então entender seu contexto e propor uma solução. Não precisamos de um status legal para isso, embora a burocracia também seja parte essencial de tudo isso. O que precisamos é iniciativa e interesse em aprender e desenvolver nossas características empreendedoras. Esse é o primeiro passo rumo ao empreendedorismo.